ENCICLICA PATRIARCAL PARA A QUARESMA DO ANO 2016


 EM NOME DO AUTO EXISTENTE

SEMPITERNO, DE NECESSÁRIA EXISTÊNCIA, O TODO PODEROSO
NÁCIO, PATRIARCA DA SANTA SÉ DE ANTIOQUIA E TODO ORIENTE
SUMO PONTÍFICE DA IGREJA SIRIAN ORTODOXA EM TODO O MUNDO
EFRÉM II

Estendemos nossa bênção apostólica, orações benevolentes e saudações aos nossos irmãos, Sua Beatitude Mor Basílio Thomas I, Cathólicos da Índia, e Suas Eminências os metropolitas; nossos filhos espirituais: Reverendíssimos Corepíscopos, reverendos sacerdotes, monges, freiras, diáconos e diaconisas e todo o povo abençoado siríaco-ortodoxo em todo o mundo. Que a Divina Providência os envolva através da intercessão da Virgem Maria, Mãe de Deus, e de São Pedro, chefe dos apóstolos, e todos os mártires e santos. Amém.

“Eu era um estranho e me acolheste” (Mateus 25: 35)

Meus amados em Cristo,

[1] Num mundo onde um irmão se torna estranho para seu próprio irmão e onde cada ser humano vive isolado buscando seu próprio interesse, cada fiel deve reconsiderar sua relação com Deus e com o seu próximo, assim estará construindo o que o ódio e o egoísmo destruíram independente do seu interesse pessoal e racial, religioso ou confessional discriminador que dividem os membros de uma única sociedade alienada. A Bíblia Sagrada dispõe o modo de tratar os estrangeiros de acordo com o agrado de Nosso Senhor, Deus.

[2] Quando o povo de Deus se estabeleceu na terra de Canaã suas relações com os estrangeiros multiplicaram e tornou-se necessário estabelecer regras para tratar com eles. No Velho Testamento o estrangeiro é o que se diferenciava pela fé, etnia ou profissão. Os pagãos que adoravam deuses estranhos e viviam nas circunvizinhanças da Palestina eram estrangeiros para os fiéis filhos de Abraão, Isaac e Jacó. Do mesmo modo os não judeus eram considerados estrangeiros porque descendiam de outros povos. A maioria dos estrangeiros não tinham profissão e labutavam no trabalho escravo: “Todos os povos que tinham ficado dos heteus, e dos amoreus, e dos fereseus, e dos heveus, e dos jebuseus, que não eram da linhagem de Israel, mas sim dos filhos daqueles que os filhos de Israel tinham deixado com vida” (II Crônicas 8: 7-8). Consequentemente a vida do estrangeiro naqueles dias não era fácil, era desprovida de poder e não tinha nenhuma autoridade. Sua vida estava a mercê dos filhos de Israel. A Bíblia Sagrada ordena “não molestarás o peregrino (estrangeiro); porque vós sabeis que coisa e ser peregrino; pois, também vós o fostes na terra do Egito” (Êxodo 23: 9). O livro do Êxodo alerta para uma espécie de igualdade entre os “indígenas” ou nativos e os estrangeiros que vivem na terra recomendando que uma lei deve regrar a todos: “a mesma lei se guardará com os habitantes do país, e com os estrangeiros que vivem convosco. ” (Êxodo 12: 49).

[3] No Novo Testamento Nosso Senhor Jesus Cristo torna-se o estrangeiro neste mundo dos homens através da sua encarnação. Tornando-se humano, Jesus Cristo teve uma nova experiência no mundo estranho à sua divindade onde Ele está com o Pai e o Espírito Santo. O mundo no qual se encarnou recusou-O: (Ele veio para o que era seu, e os seus não O receberam” (João 1: 11).

[4] Nosso Senhor Jesus Cristo deu um novo significado para o conceito de “estrangeiro” onde o perdão verdadeiro vai transformar o que é estranho a Ele por causa do pecado, devolvendo este pecador estranho a Deus. Vivendo neste mundo submissos ao pecado somos estranhos a Deus. Os cristãos são os moradores desta terra, mas não pertencem a este mundo como disse Nosso Senhor Jesus Cristo: “Se vós fosseis do mundo, amaria o mundo o que era seu: mas porque vós não sois do mundo, antes eu vos escolhi do mundo, por isso é que o mundo vos aborrece. “ (João 15: 19), por isso os cristãos são cidadãos do Reino de Deus e Jesus confirma: “O meu reino não é deste mundo… “(João 18: 36), portanto, neste mundo somos estrangeiros, alienados da nossa pátria espiritual.

[5] Notamos que a Bíblia Sagrada em geral e o Novo Testamento em particular ensina-nos a receber os estrangeiros e mostrar filantropia a eles. Sem dúvida o estrangeiro, o refugiado, o imigrante e mesmo os deslocados necessitam mais cuidados que os outros, pois, é grande o seu sofrimento e suas necessidades ultrapassam sua capacidade; por isso, eles estão entre os que mais necessitam de cuidados, pois, vivem em condições severas e estão expostos a muitos perigos fora de suas aldeias, cidades e países.

[6] A Santa Igreja não tem limites para a caridade e o amor; Nosso Senhor Jesus Cristo nos ensinou: “Ninguém tem maior amor do que este, de dar um a própria vida por seus amigos. ” (João 15: 13).  A Igreja é uma mãe amorosa que cuida dos seus filhos sem discriminação e ensina a servir os estrangeiros e dar-lhes acolhida. Desde os primórdios do Cristianismo os apóstolos e os santos padres designavam guaridas especiais para hóspedes estrangeiros. Escolhiam irmãos para assumir esta responsabilidade de hospedar visitantes e estrangeiros, seguindo o ensinamento do Divino Mestre: “Porque tive fome, e destes-me de comer; tive sede e destes-me de beber; era hóspede, e recolhestes-me, estava nu, e cobristes-me; estava enfermo, e visitastes-me. Estava no cárcere e viestes ver-me. ” (Mateus 25: 35).

[7] Hoje os cristãos do Oriente testemunham novas perseguições, mortes, destruição, expulsão, imigração forçada e até mesmo são arrancados da sua terra natal. Grande número de pessoas tem sido forçado a abandonar sua terra devido ao medo e ansiedade, mas, guiados pela esperança de viver num local melhor e sob condições mais humanas. Embora incitamos a permanecerem firmes na terra dos nossos ancestrais, temos a obrigação de ajuda-los nesta condição de perseguidos. Em vista de sentirem a indiferença de muitos fiéis, temos a obrigação de renovar a esperança nos corações destes que são vítimas do crime e da violência que os cerca.

[8] Não podemos esquecer nossos amados arcebispos, Suas Eminências Mor Gregorios Youhanon Ibrahim e Boulos Yazigi que ainda são forçados a ficar distantes por aqueles que não conhecem Deus e não respeitam os princípios de humanidade. Pedimos a todos que orem por seu retorno seguro.

[9] Servir os estrangeiros e imigrantes nos dá a oportunidade de servir a Cristo, Nosso Senhor. Ele próprio foi um imigrante quando sua mãe não conseguia achar uma casa para Ele, para recebe-Lo no seu nascimento em carne; então “ … e o enfaixou e o reclinou em uma manjedoura; porque não havia lugar para eles na estalagem. ” (Lucas 2: 7). Ele vivenciou também a imigração quando José levou-O ao Egito segundo a ordem do anjo que buscava refugia-Lo para longe daqueles que buscavam sua morte: “ … eis que apareceu um anjo do Senhor em sonhos a José e lhe disse: Levanta-te e toma o menino, e sua mãe, e foge para o Egito, e fica-te lá até que eu te avise porque Herodes tem de buscar o menino para o matar. “ (Mateus 2: 13 – 15). Naquele tempo necessitava alguém que O hospedasse e oferecesse um lugar para dormir. A Sagrada Família necessitaria também de alguém que oferecesse um trabalho, alimentação e outras necessidades básicas da vida. Quando Nosso Senhor iniciou a pregação do Reino de Deus entre o povo novamente encontrou-se como estrangeiro entre os seus e por isso disse: “… porém, o Filho do homem não tem onde reclinar a cabeça” (Mateus 8: 20).

[10] Por isso, meus amados, somos chamados a oferecer o que estiver ao nosso alcance para ajudar aqueles que vivem em condições extremamente difíceis, providenciando alimento, roupas e abrigos. Só assim estaremos servindo o próprio Senhor cumprindo seu desejo. Então ouviremos Ele dizer: “Na verdade vos digo, que quantas vezes vós fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim é que o fizestes. ” (Mateus 25: 40).

[11] A cultura na qual os cristãos de Oriente foram educados é sem dúvida diferente da que eles encontram no Ocidente. A diferença é flagrante nas dificuldades com que os refugiados se deparam em integrar a sociedade ocidental e na incapacidade de se adaptar a todas as exigências. Por isso pressionamos nossos fiéis que estão se estabelecendo no Ocidente a manterem se fiéis à nossa cultura que não queremos mudar assim como nossa identidade buscando preservar nossa herança cristã oriental que pode se comprometer no Ocidente. Precisamos também, trabalhar a conciliação sob muitos aspectos da nossa cultura com a sociedade ocidental sem sermos afetados pelo ateísmo e secularização que podem chocar se com os nossos valores cristãos. Mais importante, precisamos encontrar meios de gerar harmonia entre as culturas Oriental e Ocidental para que a imigração não se torne motivo de extinção da nossa cultura.

[12] A imigração lança muitas questões importantes no nível internacional e, por conseguinte toca simultaneamente nos domínios do social, econômico, político, cultural e religioso. Lança luz sobre a ausência de justiça social em alguns países ou sobre a falta de liberdade necessária a uma vida digna. Mais ainda ocorre uma ausência básica dos direitos humanos em determinados países como o direito de praticar livremente sua confissão religiosa e liberdade de expressão. Por tudo isso a imigração torna se um ato de recusa ou submissão entregando-se à imposição de condições sobre nós. A imigração deve refletir o desejo de seguir uma vida digna na preservação dos elementos básicos da vida mantido o direito de liberdade.

[13] Diplomatas iniciaram discussões objetivando aprovar leis restringindo a migração afim de controla-la. Fazem isso porque a imigração tornou-se instrumento de pressão sobre os países que receberam imigrantes. Alguns refugiados também têm criado problemas para os países que os receberam o que por sua vez conduz a mais extremismos étnicos e um crescimento do fanatismo nacional. Alguns ainda politizam a questão para pressionar determinados países esquecendo-se do caráter humano que esta matéria necessita para tratar dos refugiados e imigrantes como pessoas necessitadas de ajuda, aceitação e atenção. Os refugiados são vítimas de maus tratos, discriminação, recusa e às vezes perseguições. Isto aumenta seu sofrimento depois das dificuldades e perigos porque passaram para alcançar seu destino. Estamos cientes dos casos de perseguições religiosas baseadas nas diferenças religiosas nos campos de refugiados na Europa. Denunciamos tais atos e oramos para que as autoridades envolvidas ajam para prevenir tais atos. Vemos o tráfico humano crescendo de forma alarmante assim como todos os tipos de abusos. Ouvimos também relatos das mortes de muitos imigrantes praticadas por piratas antes da chegada a seu destino.

[14] Nesta Quaresma convocamos nossos filhos espirituais a abrir seus corações e lares para receber os estrangeiros e imigrantes, e, a ajudar seus irmãos que foram forçados a deixar seus lares devido às condições adversas e à miséria na sua terra natal, para que assim possamos também receber as bênçãos de abrigar estrangeiros a exemplo de Abraão que foi abençoado por hospedar anjos sem saber (Genesis 18: 1 -15).

[15] Amados ofereçamos nossos corações como lugar para a morada do Senhor, como lemos no livro da Revelação: “Eis aí estou eu à porta, e bato; se algum ouvir a minha voz e me abrir a porta, entrarei eu em sua casa, e cearei com ele, e ele comigo” (Apocalipse 3: 20), assim estaremos prontos a receber o Senhor oferecendo verdadeiro arrependimento. Jejuar é uma oportunidade para doação e caridade demonstrando nosso amor aos sentimentos do ser humano.

[16] O Senhor abençoe nosso jejum, aceite nossas orações e se agrade com nossas oferendas. Rogamos-Lhe a misericórdia às almas dos nossos amados que partiram e torne-nos dignos de celebrar com alegria a festa da Ressureição. Que a graça do Senhor esteja com todos vocês.

E Pai Nosso que está no céu….

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