Santo Efrém, o siríaco


Fonte: Drobner Hubertus R. Manual de Patrologia, Ed. Vozes, 2003 pág. 547-549

Efrém, alcunhado “de Nísibe” ou simplesmente “o Sírio”, é incontestavelmente o mais fecundo, o mais importante e o mais bem recebido autor de toda a literatura síria cristã. Nascido em 306 como filho de pais cristãos em Nísibe ou nas proximidades, depois de ser batizado aderiu aos ascetas “filhos da Aliança”, entre os quais se contava também Afraates, e carrega tradicionalmente o título de diácono.

Sob o primeiro bispo de Nísibe, Tiago (+ 338), por ele venerado como seu próprio mestre, ele próprio atuou como professor em Nísibe. Nesta época surgiu a maior parte de seus célebres Carmina Nisibena (1-34), bem como os hinos De paradiso, Contra haereses e De fide. O resultado da campanha persa do imperador Juliano “Apóstata” (abril-junho de 363) – Juliano tombou em combate, e seu sucessor Joviano deixou Nísibe para os persas – foi catastrófico para a cidade de Nísibe, que durante a vida de Efrém havia resistido heroicamente a três cercos por parte dos persas (338, 346, 350).

Efrém, em seus “Hinos contra Juliano” e nos “Hinos sobre a Igreja”, que os antecederam, decanta o acontecimento como um duro, porém merecido castigo pela volta de Juliano aos antigos cultos dos deuses e por seu procedimento em relação aos cristãos. Como no tratado de paz com Joviano os persas haviam insistido na deportação da maior parte da população romana de Nísibe, também Efrém mudou-se em 364 para Edessa, onde continuou a atuar como professor durante os dez anos restantes de sua vida, até sua morte a 9 de junho de 373. Mas não fica claro qual o papel por ele desempenhado na fundação da célebre “escola dos persas”, que por algumas fontes é atribuída a ele. Seja como for, os anos em Edessa parecem ter sido cheios de incansável trabalho, embora não se possa dizer com segurança quais de suas numerosas obras foram escritas durante este período; mas certamente figuram entre elas o comentário ao Diatessaron de Taciano (cf. cap. III.I.C.2) e os “Hinos sobre a fé” antiarianos.


A atuação e importância de Efrém ultrapassam de longe o universo língua siríaca. É verdade que ele próprio escreve exclusivamente em siríaco, mas já durante sua vida – o que é um fato sem paralelo neste terreno – ele encontrou bom acolhimento por parte tanto da igreja grega como da igreja latina. Jerônimo o incluiu em seu livro De viris illustribus [115], e refere que as obras de Efrém eram lidas na igreja após a leitura da Sagrada Escritura; ele próprio teria lido na tradução grega seu escrito sobre o Espírito Santo. O historiador Sozômeno atesta que no começo do século V dispunha de uma grande parte das obras de Efrém em tradução grega [h e III 16,4]. Hoje, porém, muita coisa inautêntica foi introduzida na ampla tradição do Ephraem Graecus; o mesmo vale também para a tradição textual latina e armênia. Sua importância na igreja ocidental, atual até os dias de hoje, é realçada pelo título honorífico de “Doutor da Igreja” que lhe foi conferido pelo Papa Bento XV em 5 de outubro de 1920, o que o coloca entre os grandes Padres da Igreja (cf. Introdução II).

A fama literária de Efrém deriva, sobretudo de seus artísticos hinos, memre (discursos métricos) e madrashe (cânticos) teológicos, ascéticos e litúrgicos, que certamente têm seu ponto alto nos sete últimos “hinos sobre a fé” [81-87] antiarianos, meditações sobre a tradicional lenda da origem das pérolas em uma concha através da fecundação pelo orvalho do céu, como imagem da concepção virginal de Maria. Com isto Efrém faz desabrochar ao máximo a típica e já tradicional forma síria de fazer teologia; já o primeiro autor sírio, Bardesanes, a teria inaugurado, e ela desempenha um papel importante na maioria dos teólogos sírios, de forma eminente p. ex. em Romano o Melodioso de Emesa (+ 560).

Basicamente a teologia síria pensa menos em conceitos e em argumentação discursiva do que o faz sobretudo a teologia latina, e em menor escala também a grega; ela pensa sobretudo através de histórias, imagens e símbolos, que se deixam apreender melhor sob a forma de poesias, cânticos e orações. Esta maneira de pensar constitui o traço básico da teologia de Efrém. Para ele a raiz de todos os erros teológicos fundamenta-se no desejo de querer apreender Deus com o pensamento filosófico, racionalista, quando ele só pode ser percebido através das imagens e dos símbolos com que os dois “livros da revelação”, a Sagrada Escritura e a criação, apontam para ele.

Por isso, na cristologia Efrém parte dos títulos bíblicos de Cristo (rei, pastor, noivo, médico); na doutrina trinitária parte da natureza (sol, fogo, raio, calor, Pai e Filho como árvore e fruto); na soteriologia ele compara o paraíso com a arca de Noé e com o Monte Sinai, e descreve a redenção como o “caminho do madeiro ao madeiro” (da árvore do paraíso à cruz de Cristo). É verdade que tal linguagem simbólica também pode ser encontrada nos Padres gregos e ocidentais, mas em Efrém sua plenitude, qualidade poética e papel teológico vão muito além.

Além disto, Efrém é comprovadamente também um mestre da prosa artística siríaca, como o comprovam suas cinco refutações contra Marcião, Mani e Bardesanes, e suas homilias e cartas.
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