Homilia do Domingo, 23/10/16 - São Lucas 18: 18-24

por: padre Pablo Neves, pároco da Paróquia Sirian Ortodoxa Santo Efrém, – São Luís – MA


(+) Em Nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, um só Deus Verdadeiro.

Que a Graça e a Paz de Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo esteja com todos vocês.

Caríssimos, seja sempre o Nome do Senhor Louvado, por nos permitir, em Sua misericórdia, celebrar o Santo Sacrifício Eucarístico nesta Igreja a quem o Senhor nos confiou a missão de testemunhar o Evangelho, Igreja esta que recebeu a Tradição de celebrar tal qual os primeiros cristãos em Jerusalém celebravam, ensinados por seu primeiro bispo, São Tiago Menor, irmão do Senhor, a quem comemoramos hoje em nosso calendário litúrgico.

Queridos filhos e filhas espirituais,

Hoje recordamos São Tiago Menor, chamado também de “irmão do Senhor”, um dos 12 discípulos de Cristo, conhecido também como São Tiago, o Justo, pelo respeito que tinha a seu tempo por sua vida ascética, reconhecida inclusive entre os judeus. São Tiago foi o primeiro bispo de Jerusalém, escolhidos entre os apóstolos para pastorear a primeira comunidade cristã, dada sua participação ímpar de liderança, biblicamente demonstrada na presidência do Concílio de Jerusalém, narrado no capítulo 15 dos Atos dos Apóstolos.

São Tiago é uma figura completamente contrastante daquela que encontramos no Evangelho de hoje. Segundo a Tradição, o apóstolo era um homem reto e religioso, de vida ascética, ou seja, de renúncia aos prazeres do corpo ou mesmo de algumas necessidades primárias. Historiadores cristãos como São Jerônimo (séc. IV) apresentam São Tiago como um homem que “não bebia vinho ou bebida alcoólica, não comia carne e nunca se barbeava ou se ungia com cremes ou se banhava […] e que “teve o privilégio de entrar no Santo dos Santos, pois ele de fato não vestia roupas de algodão, apenas de linho, e entrou sozinho no templo e orou tanto por seu povo que seus joelhos têm a fama de terem adquirido a aspereza dos de um camelo”.


São Tiago era, portanto, o que poderíamos chamar de “exemplo de religioso”, que vivia sob o que pregava, praticando de maneira irrestrita aquilo que acreditava. Já a figura que encontramos no Evangelho de hoje, num primeiro momento, poderia ser chamada também de “exemplo”, pois ao encontrar-se com Jesus, e questioná-lo sobre o que era necessário para obter a vida eterna, ele afirma ser um fiel cumpridor dos mandamentos desde sua mocidade. Qual então a diferença entre São Tiago e este homem? O que seria tão contrastante?

O Evangelista narra que este homem era rico e que, diante das palavras de Cristo “Ainda te falta uma coisa: vende tudo o que tens, dá-o aos pobres e terás um tesouro no céu; depois, vem e segue-me”, ele entristeceu-se e não seguiu Jesus, pois não estava disposto a abdicar de sua riqueza. Ainda que fosse um fiel seguidor dos mandamentos, este homem não era um vocacionado e, assim, não poderia ser um fiel seguidor de Cristo. Pois o que é vocação, se não a plena entrega ao seguimento de Jesus? Note que Cristo não escolhe seus discípulos e demais seguidores por suas vidas pregressas ou por suas virtudes externas. Ele não escolhe as pessoas por seu intelecto ou por suas qualidades físicas, sociais ou culturais. Jesus escolhe aqueles que o escolhem e, a partir disso, tornam-se novas criaturas. Escolher a Cristo é escolher o céu, a eternidade, a Palavra que não passa.

Quem diz seguir a Cristo, mas não está disposto a abdicar daquilo que lhe é mais precioso, não o segue verdadeiramente. Ser religioso é, antes de tudo, entregar-se completamente na compreensão de que “o céu e a terra passarão, mas as minhas palavras não passarão” (São Mateus 24, 35). Não é só nas atitudes e posturas externas que reside a nossa fé, pois estas são apenas reflexos de uma verdadeira transformação interna que ocorre em nossa alma ao encontrarmos com Jesus. Infelizmente, aquele homem, mesmo pessoalmente diante do Deus Encarnado, não compreendeu que suas riquezas de nada valiam, pois tudo é passageiro.

Mas não nos enganemos que a “riqueza” trazida aqui no Evangelho é apenas “material”. Somos ricos quando possuímos algo em abundancia, mesmo que isso não seja ouro, dinheiro ou propriedades. Há quem seja rico em rancor, com cofres cheios de mágoas não curadas, que não permitem o perdão. Há quem seja rico em ganância, queimando todos os dias de sua vida na busca por bens, poderes e prazeres com prazo de validade. Há quem seja rico em orgulho, não se permitindo nunca descer do alto de um castelo de areia que, cedo ou tarde ruirá. Nenhuma dessas riquezas, que de longe não são materiais, nos permitirão seguir a Cristo verdadeiramente. Nos empobreçamos de tudo isso, para que em nós haja espaço somente para Graça de Deus.

São Tiago, o Justo, não limitava-se e nem se deixava seduzir pelo respeito que tinha por conta de sua vida exemplar de religioso. Pelo contrário, doou-se completamente ao ensinamento de Jesus, pois era humilde e reconheceu que sua vida ascética só era verdadeira seja fosse, antes de tudo, nutrida pelo Evangelho. São Tiago abriu mão do respeito do mundo, assumindo a nascente Igreja cristã em Jerusalém, mesmo diante das injúrias daqueles que antes o elogiavam, mas que agora diziam quem ele era seguidor de um falso messias. São Tiago abriu mão de tudo, inclusive da própria vida neste mundo, especialmente em seu martírio, pois enquanto era apedrejado, rezava para que Deus perdoasse seus algozes, pois segundo ele, não sabiam o que faziam. São Tiago não foi um seguidor de Jesus por ser um seguidor exclusivamente de mandamentos, mas por ser, antes de tudo, um seguidor de Cristo em tudo.

Que pela intercessão de São Tiago, Nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo vos abençoe hoje e sempre.
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